sexta-feira, 10 de abril de 2009

Trago do sonho outro sonho

Me apaixonei por Neruda antes de ler seus poemas. Me apaixonei por sua vida, por suas histórias, por suas viagens, seus amores. Muitos amores, de mulheres que ele amou às vezes por pouco tempo, mas sempre intensamente. Caí de amores por ele como uma dessas mulheres que ele encantou durante a vida.

Em Neruda, me apaixonei primeiro pela intensidade com que viveu. Só depois de ler "Confesso que Vivi" fui atrás do poeta Neruda. E por saber de sua vida, entendi melhor a beleza do Chile e de cada parte do mundo por onde passou. No fim, à beira do mar, em Valparaíso, Pablo Neruda dedicou-se a amar Matilde, colecionar caracóis, escrever. O livro termina num momento onde a esperança parece não mais existir. As últimas linhas que escreve falam do assassinato de Allende e do golpe militar. O poeta está sem fôlego, o diplomata fala no último capítulo.

Allende morreu acuado. "Após o bombardeio aéreo, vieram os tanques, muitos tanques, para lutar intrepidamente contra um só homem: o Presidente da República do Chile, Salvador Allende, que os esperava em seu gabinete, sem outra companhia a não ser seu grande coração envolto em fumaça e chamas (...)".

Logo depois de Allende, ele também se vai. Tem a casa saqueada e destruída ainda durante o velório. Seu último livro de poemas ficou inacabado, mas como outros grandes homens e artistas que morreram lutando por causas infinitamente maiores que a estupidez humana, deixou para sempre um desafio aos que não suportam os sonhos do povo.


"Não há muito o que contar,
para amanhã
quando já desça
ao Bom-Dia
é necessário para mim
este pão
dos contos
dos cantos.
Antes da alba, depois da cortina
também, aberta ao sol do frio,
à eficácia de um dia turbulento.

Devo dizer: aqui estou,
isto não me aconteceu e isto acontece;
enquanto isto as algas do oceano
se movem predispostas
à onda,
e cada coisa tem sua razão,
sobre cada razão um movimento
como de ave marinha que levanta
da pedra, da água, da alga flutuante.

Eu com minhas mãos devo
chamar: venha qualquer um.

Aqui está o que tenho, o que devo,
Ouçam a conta, o conto e o som.

Assim cada manhã de minha vida
trago do sonho outro sonho."

Um comentário:

Fabi disse...

Que lindo!!!!!!!!
:)
Acho que tou precisando ler Neruda!