quinta-feira, 22 de agosto de 2013

O coração quente

Fui estudar espanhol para ler Neruda, mas saber espanhol ajudou a me aproximar e conhecer mais da obra de Lorca; que conheci na faculdade, na época que a gente montou um grupo de estudos de teatro, O Nariz de Cêra. Minha aproximação com a obra e a história de vida de Lorca sempre foram de encantamento e conhecer a Andaluzia e Granada passaram a fazer parte de um projeto de vida, que estou realizando com esta viagem.

Andar em Granada é compreender melhor sua poesia e sua obra teatral; é estar nos cenários de A sapateira prodigiosa, de Yerma, de A casa de Bernarda Alba e de todos os seus poemas. Tudo ganha um significado igual e diferente, de um contexto que a gente imagina e vê colocado em cada rua por aqui. (Queridos do Nariz de Cêra, lembrei de todos vocês aqui!)

Ontem a minha primeira programação foi caminhar até o Parque Federico Garcia Lorca e visitar a Casa-Museu, que era considerada uma residência de verão da família. Lá dentro, descobri que sua irmã mais nova viveu até os 91 anos! E ajudou a recuperar o acervo e a transformar os espaços em que o escritor viveu em lugares de lembrança e estudo da sua obra.

Saí da visita tão emocionada que passei o resto do dia chorando. Por estar em Granada, por Granada ser Lorca e por Granada ser um pouco de Pernambuco.

Meu primeiro impacto ao chegar na tarde de terça foi de um reconhecimento que me surpreendeu. Granada é o Recife dos mascates, das ruas do cais de Santa Rita; das lojas de tecidos tipo Casas José Araújo; de loja de bordado, renda, linha e botão; de sapateiro de bairro, pra onde a gente leva aquele sapato velho que a gente insiste em não se desfazer. Granada é loja daquelas de revelar fotos com exemplos na vitrine, tipo Foto Beleza e a Tabira de antigamente (lembrei de tu, Cres! :-)). Granada é um artesanato lindo e delicado; é a cultura árabe da negociação.

Granada também é Olinda, com casas antigas e igrejas e mosteiros com um encantamento únicos. Caminhando pelas ruas ontem, só me lembrava daquela música de Alceu: "Olinda... tens a paz dos mosteiros da Índia... tu és linda pra mim és ainda... minha mulher...". Alceu poderia ter escrito esses versos pra Granada.

Mas a Andaluzia é mais. É também o sertão de Pernambuco. É um calor de rachar o juízo durante o dia e uma temperatura mais que amena à noite. Granada e a Andaluzia dão um entendimento de coisas bem próximas da gente: da poesia de João Cabral de Melo Neto; da obra de Ariano Suassuna e do movimento Armorial; de Francisco Brennand; da literatura de Cordel...

"De modo que" posso dizer que senti em Granada uma emoção parecida com a que senti quando fui a Lisboa (onde também passei um dia inteiro chorando!); de um encantamento de quem enxerga e reconhece um "de onde viemos" - a influencia dos portugueses e dos árabes (mouros) no que misturamos e construímos para sermos assim, do jeito que somos. E ao usar o "de modo que" presto minha homenagem a Ariano Suassuna, que soube por aqui que teve um enfarto. Melhoras, Ariano! Espero que se recupere rápido!

Tanto em Lisboa quanto aqui em Granada o povo deve ter pensado: "tadinha! tão deprimida!" kkkkkkkkk... mas as lágrimas não são de tristeza, não. São de emoção mesmo. Saíram sem controle pelo meio das ruas. São lágrimas de felicidade, por ter a oportunidade de ver o que eu vi em Lisboa e de estar por aqui nesta região da Espanha. É uma emoção que sai sem controle, uma alegria sem fim, que vem em lágrimas.

Hoje tenho mais um dia de emoções. A cidade é super pequena e do jeito que a maioria das pessoas programa as viagens, um guia de turismo comum diria que dá pra conhecer tudo em 2 dias (do mesmo jeito que Roma é vista em 5 dias). Mas eu vou passar um pouco mais de tempo; porque tenho certas dúvidas sobre o senso comum!


PS - Ao Nariz de Cêra: Cristiane Araujo, Carolina Leão, Eduardo Melo,Bruno Albertim, Luís Augusto Reis, Luiz Carlos Pinto, Teresa Maciel, José Florêncio... se eu me esqueci de alguém, por favor completem... porque o facebook não está me permitindo marcar mais ninguém.


* Diário de uma viagem / agosto-2013 / publicado no facebook (22/08/2013)

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